A epopeia da Família Jobim, conhecida por albergar no seu seio o compositor António Carlos Jobim, iniciou-se na localidade de Jovim, Gondomar, em pleno século XVIII. Foi desta pequena freguesia que o militar José Martins da Cruz emigrou para o Brasil, mais concretamente para o Rio Grande do Sul, dando assim início a esta história.
Mas vamos começar esta incrível aventura genealógica pelo seu final.
António Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, compositor de Bossa Nova, nasceu na Tijuca, Rio de Janeiro, a 25 de janeiro de 1927. É considerado o maior expoente de todos os tempos da música popular brasileira e um dos criadores e principais forças do movimento da Bossa Nova.
Tom Jobim, como é conhecido, nasceu numa família de amantes de música e frequentou muitos encontros musicais. Quando começou a levar a sério o ofício, estudou piano com nomes como Leo Peracchi e Lúcia Branco. Começou por tocar nas boates cariocas, num período em que a Bossa Nova ainda não era realidade. As suas primeiras composições foram valsas, sambas e sambas-canções e parte desse repertório ganhou, na época, as vozes de Angela Maria, Mauricy Moura e Maysa.
Uma das parcerias mais famosas foi com o também lendário Frank Sinatra. Foi para um botequim que Frank Sinatra ligou quando quis propor uma parceria em disco com o então jovem Tom Jobim. Impressionado com o repertório que já vinha atraindo nomes como Charlie Byrd e Stan Getz, o americano chamou o brasileiro para dividir um disco. “Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim” foi um clássico imediato que recebeu todas as cinco estrelas da revista “Downbeat”.
Tom Jobim casou duas vezes, teve quatro filhos e faleceu em Nova Iorque a oito de dezembro de 1994. As primeiras flores que chegaram ao hospital foram de Sinatra.
Raízes lusitanas
António Carlos Brasileiro de Almeida Jobim nunca escondeu o carinho e orgulho pelas suas raízes familiares lusitanas.
O seu pai, Jorge de Oliveira Jobim, foi jornalista, crítico, poeta e escritor. Nascido em São Gabriel, no Rio Grande do Sul, em 1889, formou-se em Direito no Rio de Janeiro, tendo sido diplomata na América do Sul e, posteriormente, professor universitário. A sua mãe, Nilza Brasileiro de Almeida, era carioca, professora e pedagoga, e fundou e dirigiu o Colégio Brasileiro de Almeida, em Copacabana.
O avô paterno, Francisco Martins de Oliveira Jobim, era também do Rio Grande do Sul, da cidade de Rio Pardo, filho de pai português, Bento José de Oliveira, do Porto, e mãe gaúcha. Esta senhora, Maria Joaquina Martins da Cruz Jobim, nascida em Rio Pardo, era filha de José Martins da Cruz, que nasceu em Jovim, concelho de Gondomar, e fundou a sua família no Rio Grande do Sul no início do século XIX. José Martins da Cruz era um tenente de dragões, regimento especial de cavalaria do Exército Português.
Conta a tradição familiar que José Martins da Cruz quis encontrar uma forma de se diferenciar das restantes famílias portugueses que se estabeleciam por essa altura no Rio Grande do Sul. Decidiu assim acrescentar ao nome dos seus filhos o nome Jovim, em homenagem à sua terra natal. Como de Jovim se passou para Jobim é outra teoria curiosa, com raízes na particularidade do sotaque da região norte de Portugal.
Madeirenses e açorianos
Também pelo lado materno Tom Jobim descendia de famílias portuguesas, nomeadamente madeirenses e açorianas.
Foram seus avós maternos Azor Brasileiro de Almeida, de São Paulo, e Emília Pereira da Silva, do Rio de Janeiro, mas com raízes no Ceará. Foi seu bisavô Manuel de Almeida Leme, cuja mãe, Maria de Camargo, era quarta-neta de Fernão de Camargo, o "tigre", e cujo pai, Francisco de Almeida Pires, era quinto-neto por "varonia" de Luís Dias Leme.
Fernão de Camargo e Luís Dias Leme foram "bandeirantes" que, a partir de São Paulo, desbravaram o interior do Brasil, em 1635, chefiando o grupo de exploradores denominado "bandeira de Aracambi", que se embrenhou pela região de Tape, no interior sul do Brasil. Luís Dias Leme era trineto de Pedro Leme, da Madeira, falecido na região de São Paulo no fim do século XVI, onde se estabelecera.
Este era bisneto de Martim Leme - neto de António Lems, mercador de Bruges ao serviço de D. Afonso V que passou em 1483 para a Madeira, onde casou com Maria Adão Ferreira, filha de Adão Gonçalves Ferreira, o primeiro homem nascido na Madeira. Os descendentes deste e de sua irmã, Eva, a primeira mulher a nascer nesta ilha, foram chamados "casta grande".
Por várias linhas genealógicas descende a mãe de Jobim da família Arruda, das principais de São Paulo. Desde logo por ser quarta-neta de José Pires de Arruda e de sua mulher e prima Ana de Arruda Pacheco. Esta última era bisneta de Francisco de Arruda Botelho, nascido em 1641 em São Miguel, Açores, e falecido em 1684 em São Paulo, Parnaíba, onde se estabeleceu e casou com Maria de Quadros, filha do bandeirante Bartolomeu de Quadros, cuja bandeira foi até Guairá (no atual Paraguai) em 1632.
Francisco de Arruda Botelho era quarto-neto por varonia de Nuno Gonçalves Botelho, o primeiro homem que nasceu na ilha de São Miguel, escudeiro da Casa Real, filho de Gonçalo Vaz Botelho, o grande povoador daquela ilha.
O autor de "Garota de Ipanema" e tantos outros sucessos que levaram pelo mundo a música do Brasil, tem afinal as suas raízes naqueles que desbravaram os limites até onde Portugal chegou.
E tudo começou num pequeno lugar, um tal de Jovim, Gondomar.